Tuesday, November 09, 2010

Um tanque de lavar roupa...


Recentemente, mudei de casa. Essencialmente por motivos financeiros, já que o arrendamento em Benguela (e penso que em Angola em geral) é um mercado caro, complexo e um pouco anárquico).

Desde que cheguei que lavo a minha roupa. Não tenho tido s sorte de me encontrar com esse fabuloso electrodoméstico chamado máquina de lavar roupa.

Nesta nova casa, encontrei um tanque. Um tanque de pedra, com as suas rugosidades para esfregar roupa. Isso levou-me de volta à minha infância. Às primeiras aprendizagens de como lavar roupa. Claro que, como psicóloga e como escritora, reflicto que essa educação foi gravemente imbuída de estereótipos, dos quais me esforço por sair hoje em dia. Mas é o que eu tenho. A memória do calor a apertar, e de ficar parcialmente contente pela minha tarefa envolver agua. A minha cuidadora, ama e amiga Rosa a ensinar-me como esfregar a roupa, para cima e para baixo, no tanque, até fazer espuma, e espalhar o sabão por toda a roupa. Os cuidados a ter porque a pedra do tanque é dura e arranha alguma roupa.

Hoje, como professora de yoga a lavar a roupa no tanque, vejo a meditação em movimento claramente. Através daquele movimento repetitivo o cérebro encontra uma fuga, uma estereotipia que descarrega a ansiedade. Simbolicamente, lavar algo externo pode projectar a lavagem de algo interno, freudianamente, a sensação de se estar a purificar por dentro enquanto purificamos algo por fora.

O torcer da roupa à mão, à força, também me levou em flashbacks. No início, quem chega a Angola, vindo das “Europas” e outras civilizações tecnológicas fica choque, por vezes até triste, com estes actos. Mas é preciso pôr a mão na massa para sentir as coisas de outra forma. Acreditam que já ouvi pessoas com um ar preocupado e a modos que escandalizado que dizem “tu lavas a tua própria roupa?”

A Baía Azul e a minha Escrita...


Tinha eu 10 anos quando escrevi o meu primeiro poema. Mostrei-o a várias pessoas, que disseram “muito bem!”. Já nem me lembro a quem mostrei ou sobre o que é que tratava o poema.

O mal foi ter mostrado ao meu professor de língua portuguesa na escola. E pior ainda foi ele ter gostado imenso e me ter elogiado. Mais tarde, um professor meu de História publicou vários poemas meus no jornal local que ele geria. A partir daí disse para mim própria que seria escritora.

Depois vivia muito tempo entre o achar que era escritora e a crença de que viria a ser. Para alguém tão racional e lógica como eu era [e talvez ainda seja], só nos podemos intitular de escritores quando somos publicados. Será? Não será? Depois cheguei à fase em que não acreditava nisso. Eu era escritora, para continuar a ser, tinha de sê-lo logo imediatamente. E tinha de senti-lo e eu sentia-o. Passei por fases de hipergrafia total.

Só mais tarde o dinheiro entrou na jogada. Tinha de comer e viver e por isso, decidi ser escolher uma profissão: ser psicóloga. Que ilusão achar que esta profissão chegaria para viver…mas pronto. Quem melhor que uma escritora para ser psicóloga e quem melhor que uma psicóloga para ser escritora. Tudo roda em torno das pessoas, verdadeiras ou fictícias. Cresci e fui sendo ambas. Fui sendo um pouco de cada.

Os escritores passam por fases de auto-desculpas. Não tenho tempo, não consigo concentrar-me, tenho outros trabalhos…e a escrita foi ficando numa pasta no meu dos “meus documentos” no computador. Sempre que compro um computador novo ou faço arrumação de ficheiros, lá crio essa pasta “Escrita”. Talvez para me convencer a mim própria que sou escritora por mais uns anos. Mais tarde, veio a escrita científica. Escrevi artigos, relatórios, a dissertação de mestrado, o início da tese de doutoramento e muitas outras reflexões que traziam à tona os pequenos prazeres de escrever algo.

Mais tarde, o blog fez renascer alguma disciplina, sempre necessária à profissão de ser escritora. E fui publicando pequenas coisas aqui e ali. Mas no fim do túnel estava o desejo do livro, concretização que há-de chegar um dia. Fui assombrada pela crise económica: já não havia espaço para mais escritores lançaram um livro. Um livro, esse fantasma que atormenta os escritores.

A seguir, veio Angola. Aqui estou. Tal como eu imaginava, paisagens paradísiacas. Vejam as imagens que coloco abaixo, e perceberão como parece fácil obter a inspiração (imagens da Baia Azul, em Outubro de 2010, em Benguela, Angola.)

E o escritor pensa “era mesmo isto que eu precisava”. Inspiração real. Paz e sossego. É agora. Este é o momento. Agora vou conseguir o “Great novel, o best-seller”. Mas depois, as palavras parecem que fogem. Que raio de cliché.

E por muito que a minha mente se tente concentrar em tudo que há de fabuloso no mundo, outra parte de mim só consegue pensar em tudo que há de estúpido e injusto. E também aí, as palavras custam a sair. Não é o famoso bloqueio de escritor, que isso nunca vivi. É uma inexplicável sensação de frustração face ao que acontece à nossa volta, é uma sensação de total impotência perante as coisas, situações e pessoas totalmente estúpidas. E começo agora, com 32 anos, a perceber perfeitamente o que é a estupidez. Devia realmente ser uma psicopatologia e estar do DSM (Dicionário de Saúde Mental, o instrumento base de qualquer psicólogo).

Os critérios de diagnóstico deviam ser: (a) incapacidade de se colocar na perspectiva dos outros; (b) situação que dura há pelo menos 6 meses; (c) falta de bom senso generalizada; (d) perturbações de controle dos impulsos; (d) necessidade constante de emitir posturas e atitudes negativas e pessimistas perante a vida; (e) distribuição de culpa por todos menos pelo próprio, (f) incapacidade de reflectir sobre os seus próprios actos; (g) desejo incontrolável de prejudicar a vida dos outros.

Assim, escolhi duas profissões bastante difíceis, a de psicóloga e a de escritora. E, no final, dissolvi-me nessas identidades, até não saber bem a minha identidade.

A maior parte do meu tempo de vida, passo-o a tentar resolver as minhas revoltas perante o mundo. A incompetência, a estupidez, as injustiça, a desigualdade, as afirmações ridículas e discriminatórias que ouço todos os dias da minha vida. E é nesses momentos que penso que não me encaixo. Que simplesmente não sou daqui. Que devo ter vindo numa encomenda errada para o planeta errado. Nem sequer adianta muito mudar de país. Tenho de aprender a lidar com a imperfeição, dos outros e minha, a cada dia que passa.

Mas sento-me no meu portátil a escrever. E a escrita flui sempre.





Wednesday, October 06, 2010

O Príncipio de Peter


“O Receituário de Peter” de Lawrence Peter
Nas ultimas semanas estive em leituras de Gestão.  A Pós-graduação em Gestão tem aguçado o bico desta vossa amiga sempre sedenta de conhecimento...
Quando escolhi este livro, pensava que ia ser uma leitura leve e divertida, mas não conseguia deixar de parar quase em cada paragrafo e reflectir.
“O Receituário de Peter”, escrito por Lawrence Peter, o aclamado autor do “Princípio de Peter”, consegue escrever e usar citações incisivas. Já datado de 1972, parece estar hoje mais actual do que nunca.
O Princípio de Peter, aplicado à Gestão, pode ser resumido da seguinte forma: "Numa hierarquia, todo o funcionário tende a ser promovido até ao seu nível de incompetência." (no original, "In a hierarchy, every employee tends to rise to his level of incompetence").
Fez-me reflectir sobre as competências. Esse famoso tema... tema do meu Doutoramento (que decidi suspender ao fim de dois anos), tema de tantas publicações das mais diversas áreas do saber. A psicologia, a sociologia, a Gestão de empresas, a Gestão de RH, etc…
Esse meandro complicado, a competência.
Tal como Lawrence Peter, constato que o Principio de Peter, existe realmente nas organizações, mas não consigo de me sentir revoltada, triste e  preocupada com este facto.
No entanto, dessa obra, quis retirar apenas algumas citações que L.Peter incluiu no livro, de outros autores.
Boa reflexão.

“É melhor ser ALGUÉM que produz alguma coisa, do que NINGUÉM que produz coisa nenhuma” A. Pundit
(Pág.109 da obra “O Receituário de Peter” de Lawrence Peter)

“Lembra-te que ninguém pode fazer com que tu te sintas inferior sem o teu consentimento” E. Roosevelt
 (Pág.126 da obra “O Receituário de Peter” de Lawrence Peter)

“Uma pessoa com uma ideia nova é um excêntrico até que a ideia resulte”. Mark Twain

 (Pág.128 da obra “O Receituário de Peter” de Lawrence Peter)


Ficam também algumas imagens MUITO interessantes que descobri na internet sobre esta obra, incluindo algumas capas da obra...





Monday, September 27, 2010

Domingo na Jomba

Este domingo foi passado na Jomba, a cerca de 20 km do Lobito. Uma praia semi-deserta, com uma pequena taxa informal de entrada (os "moços" encarregues da limpeza insistiram que todos dessem a sua contribuição...)

A Praia da Jomba, que há muitos anos atrás possuía uma propriedade com nascente de agua e fabrica de enchimento, está agora vazia. A propriedade semi-destruída, mas a nascente de água continua lá. O paraíso de infância de alguém...

Em menos de 30 minutos apareceram muitos jovens...e pelo primeira vez vi os nativos apreciaram as aguas, nadarem, saltarem, desafiarem os mares...

Ficam algumas fotos.






À vinda para o Lobito...consegui tirar esta foto em andamento da Estátua "reabilitada" que foi colocada na avenida principal do Lobito (parece que estava no aeroporto do Lobito, e se metaforizava ao AR, agora, adaptada, está associada ao MAR...reciclagens...)

Monday, September 20, 2010

Testar limites, descobrir quem somos, sair dos “embrulhos sociais”

Viagem Benguela/Cimo/ Dombe Grande/Lucira/Bais das Pipas/Namibe

BORN TO BE WILD?

Aproveitando o facto do dia 17 de Setembro ser feriado em Angola, decidimos acampar.
Na realidade são apenas 3 dias e apesar de parecer muito, aqui em Angola, onde as distâncias são todas grandes…no fundo, no fundo, não chega para muito.
Vamos a factos: em 3 dias fizemos 930 km, ao longo de aproximadamente 10 horas. DEZ horas dentro num carro, aos tombos a maioria do tempo…

Equipados com pouco, e mantendo a filosofia que queremos estar o máximo próximo da simplicidade (porque a vida, no fundo é simples: KISS:Keep it simple, stupid!), levamos comida, alguns “luxos”. O conceito de “luxo” é relativo e muito pessoal: Um maduro tinto bem português (Monte Velho), um chuveiro próprio para Aventuras “on-the road”, um tanque de água e um leitor de DVD’s com um filme, que não chegamos a precisar sequer de ver para entreter! E um tenda para dormir, claro!

Ao ver a fotos, acho que irão perceber. Não há condições para fotografar a luz da lua a bater na praia deserta, e não há forma de captar o silêncio profundo do meio das montanhas sem viva-alma (nem pássaros, nem nenhum animal!), não há forma de vos descrever a paz de uma praia vazia.

Mas, pelas fotos, captem o que conseguirem.

E acreditem: Fazer uma fogueira só com lume e lenha é bem mais difícil do que o que parece!

Mas não há nada comparável a estar no meio do silêncio, com o mar a berrar bem alto, a luz da lua, o corpo frio a ser aquecido pelas brasas amarelas e vermelhas e laranjas, e cheiro daquele pinho ou não sei bem o nome...tão natural a queima para nos aquecer...

Todos nós estamos em “Embrulhos sociais”. Embalagens em que nos colocamos para nos promover junto dos outros, junto de todas as hierarquias e pessoas da sociedade. Só saindo definitivamente disso, conseguimos nos sintonizar com quem somos.

E é verdade: por vezes é assustador. Parece que não sabemos quem somos quando somos retirados desses embrulhos. Sentimo-nos vazios, desprovidos dos títulos e rótulos que povoam o nosso dia-a-dia. E isso assusta muito gente. Mas não tem de assustar. Os títulos e rótulos que usamos, devem sair quando nós queremos. Como uma casaco que simplesmente se despe.

Muitas descrições da prática de meditação são parecidas com o paragrafo anterior.

Por isso, muitas pessoas não estão ainda preparadas para a meditação ou para o Yoga ou qualquer outra alternativa que implique que as pessoas se dispam de todos os embrulhos (e embrulhadas…) sociais e se descubram a si próprias. E que passem tempos em solidão. E que se confrontem com todos os pensamentos pequeninos que a nossa mente tem…

É nestas enormes extensões de areal vazio, nestas gigantes montanhas, nestes espaços imensos que nem parecem deste Planeta (por ex. na Baía das Pipas) que uma pessoa consegue atingir a sua “ninguemdade”. O Estado de ser ninguém. O estado pacífico de se sentir a formiga mais pequena do planeta. Pacifico, na fase final, porque antes disso, despiram-se as frustrações e os sentimentos estranhos de afinal sermos tão insignificantes…e só depois vem a paz de ser absolutamente ninguém, e no entanto, sentir que somos únicos.

Um abraços a todos os amigos, amigos e á minha família! Muitos Beijos e abraços de 8000 km de distância!

Patty

Foto 1: Detalhe da Baís das Pipas - Namibe

Foto 2: Praia Perto de Bentiaba. Não sei o nome. Completamente Deserta, só se chega de Todo-o terreno, por uma caminho bastante escondido. A cerca de 5 minutos da Praia do Faiel (onde acampamos uma noite)
Foto 3; Praia do Faiel - Acampamento. Eu e o Meu Hermínio conseguimos fazer a fogueira para assar uns bifinhos de vaca e de peru (sim, claro, o vegetarianismo foi colocado em Stand-by já há algum tempo!)


Foto 4: Eu, em frente à tenda, a fazer o arroz de feijão e um pimento assado! Festejando o facto de ter o Monte Velho por companhia (Depois lembro-me sempre que falta "aquele" copo certo para beber aquele vinho, "naquela" temperatura certa...mas depois, tudo sabe bem...)
Foto 5 : A Fogueira: Ah, que bom o  lume a palpitar e depois as brasas...

  Foto 6: Preparando o Pequeno almoço!

Foto 7: Continuando a preparar o pequeno almoço , em formato de Brunch, enriquecido!


Foto 8: E a seguir, lavar a loiça e tomar "banhinho"...vejam bem...de chuveiro! (Para os curiosos, liga-se ao isqueiro uma pequena bombinha que entra no tanque e puxa agua!!! Fria...não se pode ter tudo...)

Foto 9: Um olival  em Bentiaba (onde se situa também o estabelecimento prisional)

Foto 10 : Mais plantações riquíssimas...

Foto 11: Uma praia pequenina, ao lado da praia de "Chapéu armado", uns quilómetros acima do Namibe (Infelizmente a Praia de "Chapéu armado" foi privatizada, e não conseguimos entrar, estava vedada)


 

Foto 12: O outro lado da praia pequenina...

Foto 13: Baia das Pipas: Namibe
 


Sunday, September 12, 2010

Festival Internacional Gastronómico na Nancy’s English School e Guest House

Decorreu há alguns fins-de-semana atrás, mais um Festival organizado pela Nancy. Claro, festival é um termo relativamente pouco justo para designar um convívio agradável, internacional e banhado sempre pela simpatia e acolhimento típico da casa!

Promoveu-se o contacto e a reflexão e cada um contou uma história lembrando um pouco a psicoterapia de grupo (sou psicóloga, né?) ou então aquelas brincadeiras adolescentes quando se vai passar um fim-de-semana com amigos! Os adultos estão gravemente a perder isso. Jogam na vida como se fosse uma batalha no Coliseu de Roma.

Como dizia o Osho, o meu grande meditador, no seu Tarot da Transformação, a vida é para ser vivida, a Brincar, como se fosse uma brincadeira leve, e não deve custar às pessoas viver…

E foi assim que nos sentimos nesta tarde internacional em que falamos com russos, búlgaros, portugueses, mexicanos, americanos, brasileiros…e acho que não esqueço nenhuma nacionalidade.

Aqui ficam as fotos… (de comida internacional, pessoas, e da fofinha cadela "Mucki"...depois de muito esforço lá consegui apanhá-la numa boa pose!)



 

 

 



 

A caminhada ao Sombreiro e a Arte de ser ninguém

Durante muitos anos ouvi, e ainda ouço por vezes, a expressão “ser alguém”, faz parte da minha infância e do conhecimento do senso comum, da sabedoria popular. Desde sempre, o considerado “povo” quis subir na hierarquia social, que infelizmente sempre existiu e, pelo caminho que vamos, parece que vai existir sempre. Não digo a hierarquia económica (haverá sempre na jogada o ESE-Estatuto Socio-económico), mas a “hierarquia das Manias” de quem é bom, a mania de ser superior, ou de achar que, por este ou aquele motivo, se é melhor que o outro. Aquela noção tão revoltante de ser superior ou inferior.

O ser alguém parece ter-se traduzido em “passar por cima dos outros a qualquer custo, para chegar a um lugar de poder, qualquer que seja”. E, no fim de tudo, apesar do mau karma que se acarreta, isso é fácil.
Difícil é ser ninguém. É não ter nem querer nenhum tipo de atenção especial. É querer ser a gota no oceano e não desejar ser o oceano.

Todos estes pensamentos me revoltam e perturbam bastante. E pensem: vivemos encafuados no dia-a-dia do trabalho…e quando chega ao fim de semana temos de respirar!!! Largar os tacões e as roupas desagradáveis, deixar de usar “coletes de forças” e “mascaras” organizacionais, deixar cair os títulos e descer de pedestais imaginários ou em quais no colocam, e ser nós próprios, procurar o nosso eu, a nossa autenticidade. Está aqui. No meio do vento e do ceú, das plantas e da terra, da areia e dos animais. Pertencemos.

É horripilante pensar que existem pessoas que passam a vida a praticar a posse, de tudo e de todos.

Um dos Yamas (Princípios éticos e orientadores do Yoga) que mais gosto e pratico é Aprarigraha: o Não-apego, o desapego das coisas materiais, o estar satisfeito consigo próprio, e sentir que já se tem e se é, tudo o que se precisa ser. A pratica da aceitação do que se tem.


Quem pratica o Apego todos os dias, está condenado a ficar sem nada, pois vive na ilusão de que possui alguma coisa…quando nada é de ninguém.

Fico triste, deixo-me invadir pela tristeza de observar tanto apego neste mundo.

Aliás, o Budismo já explicava que a origem de todo o sofrimento é o Apego…
Bem, deixando de lado as minhas aspirações a escritora, entro num registo mais soft. Vejam então nas fotos as casinhas de madeira na Baia Azul…que lindas, não são? São o meu sonho!

Vejam o caminho que fizemos para o ex-libris de Benguela, o Sombreiro. Essa Rocha em cima do monte que é a principal atracção dos postais da baía de Benguela.

Bem, apreciem as fotos da amizade, do convívio, das paisagens bonitas, das pessoas livres e felizes , nem que por umas horas apenas...

Friday, August 13, 2010

Viagem ao Lubango


Nos dias 6, 7 e 8 de Agosto fomos visitar a terra que nos acolheu por quase dois anos.

Foi triste verificar que o caminho Lubango-Benguela está pior que dantes. São 329 km apenas, que demoramos cerca de 5h30 a percorrer. Tem apenas cerca de 54 km de Picada, mas as chuvas tornaram-na pior do que estava dantes (Acho que os piores danos estão no caminho de Cacula até Chongoroi). As aguas tem uma força brutal, no inicio nem acreditava que só agua e chuva fizessem tantos buracos e abatimentos, mas parece ser verdade…

Chegados ao Lubango, também fiquei triste. Tinha expectativas que nos quase 09 meses que lá não estive, as condições tivessem melhorado. Ainda por cima com o CAN-Campeonato Africano de Futebol, esperava eu, que houvessem novas estradas e menos lixo. Mas não. O Lubango está mais ou menos estagnado nesse aspecto. Cresceram hotéis, lojas na rua, o shopping Millenium tem mais oferta e o aeroporto, mas alguns buracos e alguns cantos de lixo estão iguais.

Na foto que publico em baixo, estou no Hotel Serra da Chela, de 4 estrelas. Impecável. Agora o Lubango já tem um sitio agradável onde passar uma tarde, na piscina e em excelente ambiente.

A estrada para o aeroporto está também melhor, mas temo que as chuvas possam destrui-la facilmente, já que a obra é frágil, quer de materiais quer de recursos humanos…

No fim…as pessoas! Os meus alunos, ou melhor, ex-alunos…que nó na garganta! Que carinho e que recepção! Abracei diversos alunos e fiquei triste por terem perdido a oportunidade de continuar os estudos de ensino superior! E que dedicados eram…

Espero que o novo ministério do ensino superior, ciência e tecnologia, reconheça que tem ali potenciais quadros médios e superiores muito importantes para Angola, e acima de tudo, além dos conhecimentos técnico-científicos tem ali potenciais colaboradores motivados e dedicados, carinhosos e empáticos…Um abraço a todos e todas!

Depois, as noites foram passadas no novo CASINO OLYMPIA- Porquê? Porque o meu grande amigo Nuno, marido da minha grande amiga Jacy, trabalha lá, porque é o melhor local para estar no Lubango, porque eu fiz o processo de recrutamento e selecção, e a consultoria para abertura e cartaz cultural bem como a selecção do responsável cultural (o NUNO!) e, finalmente, porque o meu maridão actuou lá. Ainda não foi desta, que tive coragem para pegar no microfone…não.

O Hermínio é o equivalente a um “encantador de serpentes” quanto toca a harmónica aqui no Lubango. O som da harmónica enche-nos o peito, é inevitável…

Por ultimo, temos de vos falar deste Duo encantador. O Duo Nova Vaga. Como podem ver na foto, dois músicos maduros, que executam brilhantemente música variada (desde originais, Beatles, fados, música tradicional Angola, e musica comercial diversa!) com uma guitarra e um SERROTE! Sim, um serrote. Não há como explicar esta arte de sacar as notas certas de um serrote com uma régua de plástico! E que som hipnotizante! Parabéns Duo Nova Vaga!

E pronto, passeio muito cansativo para apenas 3 dias. Não se repetirá em tão pouco tempo, mas voltarei ao Lubango em breve, a terra das pessoas sorridentes e afáveis…

 



 


 


 

 




 

 

A Praia da EQUIMINA

A praia da Equimina

     Já por duas vezes fomos à praia da Equimina. A cerca de 115 km da cidade Benguela, e depois de passar a vila do Dombe Grande (onde acaba a estrada em asfalto) temos de percorrer uma ligeira picada de talvez 50 km.
     Da primeira visita, fomos apenas dois e ficamos pouco tempo. Caminhamos uns quilómetros pela praia quase deserta. Curiosamente vimos pela primeira vez um misto de Kimbo/musseque ao pé do mar. Uns meninos brincavam nus feitos croquetes e outros tentavam pescar com uma espécie de rede, arrastando a rede pela agua. A meio da praia surge um lago de agua doce ou salobra e um oásis. Juro que pensava mesmo que os oásis eram coisa rara.
    Da segunda vez fomos com amigos para um churrasco à portuguesa, como “manda a lei”. Ficamos perto dos angolanos que ali vivem em condições aparentemente fracas. São pescadores e vivem essencialmente de peixe seco que vendem em Luanda (descobri depois a falar com um “amigo”…).
    A Palavra “amigo” é altamente utilizada cá, com um cadência e um sotaque impossíveis de descrever em palavras. Sinto-me como um Vasco da Gama a tentar escrever uma carta ao rei de Portugal contando os frutos dos descobrimentos! Diz-se “migo”, com um som musicado e afectivo.
     Os meninos brincaram à bola com um dos filhos dos nossos amigos. Dêmos-lhes uns petiscos. As mulheres arranjavam os peixes em bacias (alguns com 50 cm de comprimento ou mais) e com os filhos às costas. Os homens depois carregam os peixes, abertos ao meio da transversal e já salgados para pôr a secar, dentro de grandes bacias quadradas e ainda demoravam um pouco a voltar. O tal meu “migo” veio perguntar se lhe podíamos dar alguma da nossa comida (estávamos a fazer churrasco!), e comentou “Amiga, eu peço, mais vale pedir que roubar, né?”.
  
    Depois viu-nos a ler uma revista (A “Caras” ou a “Nova Gente” ou algo assim…não sei), e pediu se não lhe podíamos dar. Ficamos surpreendidos. Perguntamos se lia bem português, e ele, orgulhoso respondeu “Eu tenho a minha sétima!” (Será que tem a sétima classe? Ficamos convencidos que sim, demos-lhe a revista e elogiamos o seu português). Ele era extrovertido, já na casa dos seus 40 anos e com 1.75, um pouco mais alto do que eu. Pedi-lhe para ver o peixe e chamou-me.

     Perguntou-me “A amiga come deste peixe? ” , eu respondi que sim, que tinha comido no dia anterior no Calulu (prato da gastronomia angolana…delicioso!). Ele ficou surpreendido e saiu apressado…passado uns seguintes trouxe-me um peixe e disse-me para eu levar para fazer Calulu!!! Agradeci imenso mas ficava para a próxima, Foi nessa altura que me contou que iam de camião a Luanda vender o peixe já seco (tipo bacalhau, na seca). Um metro de altura de peixe empilhado devia render 500 dólares. Fiquei sensibilizada pela oferta.
     Mais tarde, as crianças rodavam à volta da bacia de deixe que um dos nossos amigos caçou (ele lá foi durante uma hora em caça submarina e trouxe um peixe papagaio!). Para uma ex-vegetariana é triste ver um peixe morrer aos poucos… Mas aqui, não há muito a fazer. Já encontrei bastantes produtos vegetarianos do SHOPRITE no Lobito, todos de origem sul africana e muito deliciosos! Ao menos vou tentando manter algumas refeições vegetarianas! Parabéns ao Nelson pela excelente caçada!

    O meu 'Migo disse que na próxima vez que lá fossemos ele vai dizer ou indicar ao meu amigo caçador onde pode caçar os Chocos. Os chocos são uma delícia aqui em Angola. São enormes e ficam deliciosos na brasa, nada que se pareça com os "choquinhos" que se come na minha terra...
    Uns minutos depois as crianças viram-me a tirar fotos e queriam ver na máquina digital, Já tinham algum conhecimento pois não se mostraram fascinadas. Tirei-lhes uma foto (que vêem aqui no blog). Na primeira, foi guerra! Todos s tentar caber na foto! Disse-lhes “Então, vocês não eram jogadores de futebol?  Os jogadores posam para a foto tocando ombro com ombro! Cabem todos na foto!”. Olham para mim e depois uns para os outros e repetiam “Ombro com ombro…ombro com ombro…” e lá se ajeitaram para a segunda foto. “Olha eu aqui”, “Olha eu aqui”, apontavam felizes e como que pasmados para a máquina tão pequena que mal conseguia colocar todas as cabeças a jeito de se verem nas fotos…
    Foi um dia bem passado. Fez-me reflectir na vida dos pescadores contra a vida cosmopolita e hipócrita que às vezes levamos. A certa altura, uma mãe surgiu, com um filho às costas, uma filha mais velha ao lado e um filho que as seguia. A criança vinha pasmada, absorvida pelas brincadeiras dos meninos negros e brancos, todos juntos, a jogar futebol. Tanto por alguns traços físicos, como pelo comportamento, notava-se que a criança tinha um ligeiro atraso de desenvolvimento (os "Psis" às vezes, não desligam mesmo…). Mas ali ficou, sentado, sempre a sorrir, captando as imagens, com movimentos lentos e com o que podiam ser suspiros de alguém perante algo que se seja muito, um grande chocolate ou um hambúrguer!
    Lá acabou o passeio. Aqui ficam as fotos. Talvez ainda publique mais. Para já ficam estas.